sábado, 7 de fevereiro de 2015

Invisíveis Certezas - Encontro, abraço e a dor de sentir, capítulo sexto.


Para ler como a Alicia sentiu esse capítulo, entre nesse link.
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Sem me demorar muito, o encontro. 





Bom, eu tentei. Matei aula, fui assaltado, esperei horas sentado em um banco de shopping, descobri que o senhor das câmeras de segurança do meu prédio também trabalha na Pinacoteca, pra chegar no final e nem ao menos ver a menina por quem fiz tudo isso. Mas eu passaria por tudo de novo, mesmo sabendo que não iria adiantar. Faria tudo de novo só para manter ainda em meu coração a esperança de ter apenas um vislumbre da Alicia entrando em seu ônibus para voltar para casa. Infelizmente eu não teria outra oportunidade, e era isso, apesar de todas as adversidades do dia, o que me doía mais.
Esperei longos dois minutos até que seu Manoel me disse gentilmente que precisava continuar seu trabalho. Saí da sala com a mente pesada de quem não dorme a dias, mas de quem não quer dormir para não ser assombrado por um rosto lindo em seus sonhos. Então, meus olhos pareceram ter ganho um presente. Deus, em toda a sua singularidade e perfeição, já fez olhos mais dourados que os dela?
Sempre achei ridículo aquelas cenas nos filmes onde o casal apaixonado se reencontra e vai correndo em câmera lenta até que se abraçam e, às vezes, a mulher até levanta o pé. Confesso que passei algumas noites em claro pensando em qual seria minha reação quando finalmente a visse. Mas eu também não havia sequer imaginado que o dia de hoje seria tão maluco, então não faz diferença.
Você deva estar curioso agora. A realidade é que não tive reação nenhuma. É, Newton, me explica essa. Ou, talvez, não ter nada em mente seja uma reação ao turbilhão de sentimentos que me atingiram diretamente do lado esquerdo do pâncreas. 
Parecia que o tempo estava parado por uma eternidade. As pessoas que eu via passando perpendicularmente no final do corredor não faziam parte do mundo onde eu e ela estávamos. Eu era a busca, ela era a razão. 
Alicia se recuperou da surpresa mais rápido que eu e eu tive que me forçar a caminhar até ela.
Foi o abraço onde eu gostaria de morar para sempre. 
Segurei seu rosto em minhas mãos e permiti que o momento falasse mais alto. Já começava a sentir seu hálito se fundindo com o meu, quando uma voz nada amigável a chamou.
Era seu professor. Senti o corpo de Alicia se enrijecer ao meu lado e vi que não era bom ele ter nos encontrado aqui. Tive que dar um jeito de mostrar que era eu o motivo por ela não estar junto de sua turma. Ele disse que eu poderia acompanhar a excursão, e eu quase o abracei. Se ele tivesse visto problema por eu ir junto com ela, seria bem mais difícil. Parece que as coisas estão melhorando para o nosso lado, apesar de tudo.
Continuamos por mais algum tempo na Pinacoteca e eu tentava aproveitar cada segundo ao lado dela. Assim como eu, Alicia se prendia às particularidades. O que tornava algo único é o que mais me agrada, e eu sentia que para ela, as características superficiais também não era significativas. Eu poderia observá-la para sempre e nem assim me cansaria. Era como o quadro que nenhum pintor jamais ousou tentar representar.
Dali fomos para o Museu da Língua Portuguesa. Tudo naquele lugar a encantou. Vi seus olhos percorrerem cada cantinho e curva e detalhe. Uma pena que as horas se passaram rápido demais para nós. 
Os professores avisaram que a última parada seria o shopping, novamente, para um lanche. Pude ir com eles no ônibus.
Chegando lá, nos demorar na praça de alimentação era tudo o que não queríamos. Então, comemos uns cupcakes que a Alicia disse que era arco-íris em forma de comida, e eu fui mostrar a ela uma das minhas lojas preferidas daqui, uma de discos. Eu, que já tinha os Los Hermanos como banda favorita no mundo, agradeci mentalmente a cada um dos quatro. Alicia e eu parecíamos crianças quando vimos o palhaço na capa do disco e um cartaz em cima com letras vermelhas dizendo que estava pela metade do preço. 
Abracei-a com força e aquilo que eu sonhei fazer desde o dia em que a vi, aconteceu. Não importava se havia pessoas em volta, se o tempo que tínhamos juntos estava acabando, ou se o professor dela chegasse novamente. Foi mais que um beijo, foi a materialização do que sentimos.
Alicia me disse que não tinha ido à livraria pela manhã, quando chegaram. Já era meio óbvio, foi por isso que não nos encontramos antes.
Por entre prateleiras e conversas sobre os nossos melhores escritores, encontramos uma parte da turma dela. Alicia me disse que precisa escolher um livro para a Isabela, e foi procurá-lo com a Lu, outra amiga. 
Aproveitei para comprar um para ela, e escolhi um que me chamou atenção pela nota do John Green na capa. Ela havia me dito que era um queridinho dela, então não tem erro. Se ele aprovou, ela também aprovaria.
Enquanto ela ainda estava na busca pelo presente da amiga, fui conversar com os garotos da sua sala. 
-Então, você tá com a Alicia né, cara?
Era um de calças largas, boné virado para trás e uma camiseta branca com escrito em inglês que eu tinha certeza que ele não sabia o que significava. Nem seus amigos. Caso contrário, não deixariam a chance de zoá-lo escapar.
-Sim, estou.
Ele deu uma risadinha que me fez ter vontade de fazê-lo engoli-la. Passou a mão em volta dos meus ombros e me virou para que só eu pudesse ouvi-lo.
-Olha, conselho de irmão. Ela pode até ser gata, mas não dá nem pra dizer que eu me diverti com ela. Não vale a pena, sabe...
-Eu sei me virar sozinho... irmão.
Desvencilhei-me do seu braço e caminhei até a sessão de livros infantis. Esse cara só pode estar de brincadeira comigo. 
-Oi, Gui! Olha o livro que escolhi pra Isa. E esse é pra você, espero que você goste.
Eu a entreguei o meu embrulho também, e nos surpreendemos por saber que havíamos pensado a mesma coisa. Ela também me deu Eleanor & Park, da Rainbow Rowell
Deixei para pensar no idiota de blusa feminina depois e ficar numa boa com a Alicia.
Ficar numa boa por mais dez minutos. Era o que restava dessa excursão à São Paulo e do nosso tempo juntos. 
Disse para ela ficar tranquila, que logo iríamos nos ver novamente. 
Os dias iriam se arrastar sem ela aqui. Agora que experimentei a sensação de ser dois vai ser difícil me acostumar de novo a ser um.
Abracei-a novamente com vontade de não permitir que ela se fosse. Tentei ser forte o quanto pude. Ver a angústia no rosto dela estava me matando. Prometi a mim mesmo que se dependesse de mim, ela não ficaria triste desse jeito nunca mais. 

Então, depois de todos os protestos daqueles que já estavam preparados para ir embora, ela e eu nos afastamos. Levando consigo todo o meu amor, Alicia entrou no ônibus.





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